Roma Antiga

Blog sobre a Roma Antiga: história, cultura, usos e costumes.

quinta-feira, maio 24, 2012

Roman Sex

de John R. Clarke É um livro sobre sexo na Roma antiga, do final da República até ao fim do principado (séc. I AC – II DC). É um livro de arte, sobretudo com fotografias tiradas dos frescos de Pompeia e objetos do quotidiano (lamparinas, taças, etc.). O autor é um historiador de Arte numa Universidade Norte-Americana. Na introdução, ele começa por indicar que a sexualidade doa antigos romanos não é a dos nossos contemporâneos (fortemente influenciada pelo cristianismo, mesmo por parte de quem rejeita esta religião e o seu legado). Também explica que a esmagadora maioria das peças referentes a sexo, só muito recentemente foram disponibilizados ao público, estando anteriormente fechadas em caixas ou aparecendo em fotografias censuradas; com os anos 90 a situação inverteu-se. No capítulo seguinte, ele mostra vasos gregos clássicos: aí vê-se homens e mulheres que são penetrados analmente e oralmente por múltiplos parceiros revelando (segundo o autor) uma total submissão e rebaixamento dos “passivos” que são vistos como mero recetáculo de prazer enquanto os homens que estão a penetrá-los estão a usufruir de prazer (identificados com cidadãos). O sexo é assim uma relação de força entre desiguais. São depois mostradas imagens helenísticas em que existe uma total modificação: ambos os parceiros usufruem de prazer e estão em situação igual (independentemente do sexo). Dá-se de seguida um salto à Roma do final da república. Aqui podemos observar todo o tipo de relações possíveis e imaginárias. Desde masturbação solitária, casais homo e hétero, trios, grupos maiores, zoofilia, pedofilia. Mas segundo o autor, todos tem algo em comum: as pessoas estão a aproveitar o sexo, não são forçadas (mesmo que sejam escravos, tentam aproveitar o momento). Existe assim uma atitude mais positiva (mesmo que embelezando demasiado a realidade). As diversas imagens são contextualizadas em relação à atitude de Roma sobre o sexo. Teoricamente o sexo era para procriação: um cidadão devia ter o máximo de filhos possíveis com a sua esposa. Na realidade, as atitudes variavam de acordo com a classe social. Assim, nas classes superiores, os proprietários usavam os escravos e escravas para sua satisfação dado que lhes pertenciam; em compensação, pouco utilizariam prostituto(a)s. Mas com algumas limitações: se ninguém via problema em um nobre ter sexo com um homem, este tinha de ser de estatuto servil (escravo ou liberto) e nunca cidadão. Nem poderia (o proprietário) sofrer sexo anal e muito menos fazer sexo oral a outra pessoa (homem ou mulher não interessa). Uma sexualidade diferente da nossa sem dúvida, mas também com restrições (qualquer uma destas acusações era suficiente para levar à expulsão do senado de um dos seus membros em tempo normal). Para um plebeu cidadão, estes tabus também valiam, podendo levar à expulsão do exército ou de qualquer magistratura exercida. Só podia praticar estes atos livremente quem nada tivesse a perder, ou não tivesse ambições (isto não quer dizer que os cidadãos não o fizessem, apenas que tinham de ter muito cuidado em não ser apanhados). Quanto às obras em si. As pinturas que representam a quebra de tabus existem segundo diversos contextos, tendo diversas interpretações. Por exemplo, as imagens existentes nos banhos públicos, seriam imagens que pretendiam afastar o mau-olhado (provocavam o riso que quebra o mau olhado). As nas tavernas serviam para divertir os clientes. As dos bordeis, bem, que imagens mais apropriadas? É como se os romanos tivessem uma série de comportamentos proibidos que eram projetados na arte. Os objetos tinham também diferentes objetivos: alguns para dar sorte, virilidade, fertilidade. Ou simplesmente celebrar o sexo. Algumas das conclusões parece-me algo forçadas: a taça que mostra dois homens adultos a fazer sexo e que segundo o autor representa um quebrar dos tabus romanos. Ora a dita taça é segundo o próprio autor, oriental, com uma inscrição grega com uma dedicatória de um nome grego para outro grego, logo foi feita num contexto extraromano. A minha opinião sobre o livro? De forma geral gostei. Não é um livro que aprofunde muito a sexualidade dos romanos, aceita muitas vezes de forma literal aquilo que lhe é apresentado nas fontes (como na questão do preço das prostitutas, custarem no mínimo 2 asses- 1 copo de vinho). Mas tem um bom conhecimento dos povos mediterrânicos, viajou bastante para fazer comparações, percebe de arte e faz bons saltos dedutivos. Deste modo, termino o blog Roma Antiga: este será o último post. Com o pouco tempo que tenho disponível, só raramente escrevo artigos. Assim, decidi parar de escrever. Despeço-me e agradeço a amabilidade de todos os que acompanharam este blog. Até sempre! Fabiano

quarta-feira, janeiro 04, 2012

Os vasos gregos em Portugal

Embora o tema não seja sobre Roma, é sobre o período clássico e decidi incluí-lo.
Encontrei este livro sobre uma exposição organizada pela Professora Maria Helena Rocha Pereira em 2007 e comprei-o.
Em diferentes capítulos (escritos por diferentes autores, e isso nota-se nos estilos de escrita), é apresentada uma história sucinta da Grécia arcaica e clássica, a evolução dos vasos (sendo incluído um glossário dos tipos de vasos, funções e respectivo desenho, o que é bastante útil), e as principais colecções existentes em Portugal (e o modo como vieram cá ter).
Temos depois diversos catálogos dessas colecções. Basicamente, dividem-se entre as colecções particulares (vasos comprados no estrangeiro em leilões ou mesmo nas escavações onde eram descobertos), sendo normalmente de grande qualidade e espólios de escavações em Portugal; estes normalmente são fragmentos (a maioria descobertos no sul) de pior qualidade, pois eram provavelmente produtos criados para os mercados periféricos, havendo assim menos preocupação na sua produção.
Quanto às peças, há de tudo, desde o período micénico até helenístico. Vasos com motivos geométricos, figuras negras, figuras vermelhas. Os temas são os mais variados: mitologia, teatro, cenas do quotidiano.
O único reparo foi a bibliografia que me pareceu algo desactualizada: com raras excepções, os livros eram maioritariamente anteriores a 1980.
O livro foi assim uma boa aquisição. Para o leitor interessado no assunto, dá uma boa introdução ao tema, podendo recorrer a outros livros se quiser aprofundar os seus conhecimentos.

terça-feira, novembro 22, 2011

Vacas e dividas
Foi-me enviado por um docente no estrangeiro, um artigo feito por arqueólogos no Reino Unido. Basicamente, eles decidiram re-analisar uma tabuinha descoberta na Holanda nos principios do século XX; na época, estando ela bastante apagada, utilizando as técnicas possíveis concluíram que se tratava da venda de gado no principio do Império (meados do século I); por razões nacionalistas, o documento foi sempre considerado importante (pois concluía-se que se referia ao gado bovino da Frísia ainda hoje afamado).
A equipa que decidiu analisar a tabuínha, utilizou novas técnicas e concluíu que se tratava de um documento em que se referia à divida que uma pessoa tinha para com um escravo sendo este propriedade de uma mulher provavelmente esposa de um oficial. Diversos dados permitiram identificar o documento como sendo anterior à revolta Batava (cerca de 28 AD), com referências a tropas irregulares e legionárias.

sexta-feira, setembro 23, 2011

Comprei o número de Agosto da revista francesa "Arqueologie". O número era dedicado a mosaicos (grécia, sobretudo Roma e um pouco de Bizâncio, no século VI). Saíram artigos sobre descobertas em França e Itália; equipas de artistas fariam os mosaicos por encomenda num atelier e depois deslocavam-se à villa/domus do proprietário e aí montavam-no. Num artigo sobre Esparta, fiquei a saber que no período romano, a cidade era um importante centro de fabricação de mosaicos. No norte de africa, essa arte desenvolveu-se particularmente dos séculos IVa VI, entrando em decadência no século VII antes ainda da conquista árabe. Mas os melhores exemplares continuam a vir das costas da Turquia e da Síria.
Apesar da unidade de civilização, formavam-se verdadeiras escolas regionais que tinham preferência de temas ou na maneira de os abordar.

quarta-feira, julho 27, 2011

The Oxford Handbook of Roman Studies

Veio-me parar este livro às mãos e por curiosidade li-o. Como o título indica, é um compêndio de artigos sobre Roma (55 artigos). Os organizadores queriam evitar a hegemonia de correntes historiográficas ou nacionalidades abraçando o multiculturalismo, daí terem convidado pessoas de diversos países: temos norte-americanos e britânicos, mas também italianos e alemães.
Os temas são diversos: iconografia, arqueologia, género (mulheres e homossexuais), sexualidade, discursos de poder, etc. São bastante desiguais (alguns limitam-se a fazer revisão de bibliografia, outros fazem uma historiografia do assunto, outros apresentam as suas próprias investigações), mas de forma geral é tudo demasiado especializado: não é um livro para amadores ou simples curiosos da história de Roma como eu, mas sim para historiadores profissionais terem uma ideia do que se faz em termos de investigação sobre esses diversos assuntos. Muitos deles destacam-se sobretudo pelas abordagens inovadoras que fazem de assuntos que já foram estudados por outros prismas (apreciei diversos estudos de semiótica), mas de forma geral sem se ter efectuado uma série de leituras indicadas pelos autores, grande parte do conteúdo (ou interesse) escapa-nos.

quinta-feira, junho 30, 2011

Spartacus-Blood and Sand

Um amigo meu viu um episódio. Eu já tinha visto a série toda há uns meses, portanto vou dar o meu veredicto.
Acho a série muito fraca. Parece um cruzamento entre a série "Roma" e o filme "300", mas muito pior que ambos. O argumento não é grande coisa (decidir que 12 episódios vão ser sobre o treino de um gladiador, reduz as hipóteses de acção e intriga ao mínimo), diálogos pobres. Excepto dois actores (Batiatus e Lucretia), os actores são mediocres (e mesmo estes dois estão muito limitados pelos textos que tem disponível, embora façam o que podem). Os combates em slow-motion aborrecem-me.
Pontos positivos: achei interessante o desprezo demonstrado por toda a gente pelo lanista Batiatus (que era real: os lanistas estavam no fundo da escala social, mesmo que fossem riquissimos). Os cenários são razoáveis. No final, a série melhora um bocado, mas nada de extraordinário.

quarta-feira, junho 15, 2011

Jewish Military Forces in the Roman Service por Jonathan P. Roth
É um artigo de um historiador norte-americano. O tema é interessante e levanta boas questões, mas tem defeitos fatais.
Começa pela questão de saber a identidade das pessoas. Os historiadores antigos tinham a tendência para fazer generalizações (o que é compreensível em zonas pequenas com enormes diversidades étnicas). Assim, na síria, um habitante poderia ser chamado de sírio, independentemente de ser sírio, judeu, ou outra etnia diferente. Depois existe a questão da identidade da pessoa. São Paulo era romano ou judeu? Ambos obviamente, mas em contextos diferentes ele seria considerado judeu (para os seus correligionários em questões religiosas) ou romano (do ponto de vista jurídico).
É apresentado de seguida um panorama da organização militar dos Herodíades (na maior parte das vezes recorrendo a Josefo que utilizava vocabulário grego tirado dos exércitos helenísticos para descrever o armamento, patentes e estruturas dos exércitos judeus, o que confunde as coisas dado que se ignora o que ele quer dizer com esses nomes).
Os diversos reinos da dinastia de Herodes foram recrutando diversas unidades de outras populações: samaritanos, idumeneus (basicamente minorias que eram detestados pelos judeus). Mas o autor considera que estas populações eram judias também (mesmo que não fossem assim considerados pelos judeus seguidores do Templo de Jerusalém), portanto, quando o autor fala de tropas judias ao serviço de Roma, será necessário fazer essa ressalva, pois ele está a considerar populações que normalmente não são vistas desse modo (dado que o termo “judeus” é habitualmente reservado aos seguidores do Templo).
A esta luz, faz algum sentido o comportamento de boa parte das tropas “judias” que ficaram do lado de Roma (embora algumas se tivessem juntado aos revoltosos, o que mostra que as coisas deviam ser longe de ser lineares).
São apresentados diversos casos de legionários e oficiais subalternos com nomes romanos que são considerados como judeus dado que serviam em unidades estacionadas na Judeia. Ora, isso parece-me um argumento um pouco forçado. É certo, que se no ocidente as legiões eram recrutadas em Itália (ou descendentes de italianos em colónias), e no oriente desde cedo se recorreu ao recrutamento no oriente, isso não quer dizer que as tropas fossem de origem local. Sem outro tipo de evidência (diplomas ou inscrições em túmulos), acho arriscado considerar que alguém com um nome romano é forçosamente judeu…
O autor considera que a famosa guarda do templo que teria prendido Jesus, não era constituída efectivamente por guardas, mas sim que os evangelistas confundiram por ignorância da realidade, guardas com sacerdotes que seriam guardiões do templo (sem grandes provas na minha opinião). Também considera que a coorte romana que é referida no evangelho, não existiu, ou quanto muito seria constituída por samaritanos.
Termina com “que fizeram os romanos por nós”, descrevendo os zelotas como um bando de fanáticos, perseguidor de outras populações, verdadeiro obstáculo ao progresso civilizacional, paz e prosperidade que os romanos trouxeram, sendo para o autor, os judeus que colaboraram com Roma os verdadeiros patriotas. Confesso que tive de me conter para não me rir com esta última parte. Percebo que se admire muito uma civilização, mas um bocadinho de objectividade e sobriedade é o mínimo que se pede a um historiador profissional.
A bibliografia aliás ajuda a explicar: alguns sólidos livros de historiadores, mas nada ligado à arqueologia.